Ciro Guerra, educador físico e proprietário da Academia Ciro Guerra Fitness, de Pilates, escreveu especialmente para o blog da Rakete sobre lesões esportivas, com ênfase em lesões no tênis que tanto prejudicam a performance, ou mesmo afastam jogadores das quadras, amadores ou profissionais
A prática esportiva pressupõe uma atividade voltada para o desenvolvimento e a promoção da saúde. Faz parte de um comportamento comprometido com valores higiênicos e saudáveis. O esporte democratiza as relações humanas, fortalece o espírito e nos traz a saúde. Assim é seu retrato em nossa sociedade. Acreditando ser essa uma boa opção no menu de uma educação significativa e integral, encorajamos nossos filhos à prática do esporte. Porém, o cuidado com lesões deve ser tratado com bastante cuidado.
O esporte é capaz de fazer tudo isso: jogar, competir e treinar são ações que promovem e fortalecem o caráter e a personalidade dos atletas. Vencer e se sentir vencedor faz do esporte uma materialização dos desejos de superação, luta e empenho.
Mas também há o outro lado da moeda: o lado do insucesso, da perda e da impotência da derrota. O esporte ensina também a humanizar o homem, ao mostrá-lo frágil e incapaz. No caminho tortuoso da busca dos sonhos existem muitas pedras. As que espetam e comprometem a performance, são as lesões esportivas. Elas significam sempre um obstáculo na busca de sonhos e resultados positivos.
Este artigo tem a intenção de resgatar a realidade da vivência esportiva e encorajar a prática do esporte como agente promotor de bem-estar e qualidade de vida. Pretende também suscitar no leitor a coerência e o espírito crítico para enxergar o esporte de forma clara, lisa e direta. Os perigos que rondam a prática esportiva devem ser apontados. Devem ser questionadas as demandas físicas extremadas e suas consequências na interferência da saúde do atleta.
A discussão sobre as lesões abre uma excelente possibilidade de entendimento da relação entre benefícios e malefícios da prática esportiva. Vamos a elas!
Lesões esportivas como fatores de desequilíbrio entre demandas físicas e capacidades individuais
A linha entre saúde e lesão é tênue, seja em atletas amadores ou profissionais, iniciantes ou experts.
A lesão desportiva ocorre como resultado de uma soma de fatores. Mensurar uma relação linear entre causa e efeito não traduz a origem exata do processo que gera uma lesão. Conforme Guedes et al. (2010), o efeito somatório da constante exposição a esforços repetitivos gera agressões ao organismo. Os desequilíbrios musculares são resultados destas ações repetitivas. Eles aparecem como vilões na origem das lesões.
O desajuste entre o que uma ação motora específica demanda e a capacidade em realizá-la é determinante no processo de desenvolvimento de uma lesão.
O excesso da sobrecarga do treinamento e das competições pode produzir efeitos deletérios para o corpo.
Fatores individuais, como experiência, nível competitivo, condição física e psicológica, traduzem a estrutura e demanda física que um atleta suporta. Sem estas variáveis levadas ao pé da letra, a organização de um treinamento seguro cai por terra. Adequar a carga de treino, o conteúdo e a metodologia dos exercícios às necessidades e possibilidades individuais é condição básica para se evitar grande parte das lesões esportivas. O estilo de jogo do atleta e a estratégia tática adotada também norteiam a prática bem orientada das cargas de treino (MORAES & BASSEDONE, 2003).
Toda a metodologia de treinamento deve estar condicionada aos aspectos e características individuais do atleta. O conhecimento claro e definido dessas características pelo treinador é o pilar de segurança na elaboração de um treino seguro e eficaz. A correção de gestos errados faz toda a diferença na profilaxia das lesões. A contínua repetição de erros técnicos possibilita a incidência de lesões musculares e articulares, conforme apontada pela literatura (CHIAPPA et al, 2001; PALERMO, 2003; GARRETT et al., 2003).
Cada modalidade desportiva apresenta características específicas de lesões. Exatamente pelas características biomecânicas da técnica, existe uma incidência singular de lesão para cada esporte. Isto deve basear e nortear o conteúdo de treino, os exercícios e a carga de trabalho. As metodologias devem ser específicas para grupos específicos.
Lesões no Tênis – características e incidência
A extremidade inferior e a coluna representam 50% a 70% de todas as lesões no tênis. (LINHARES, 2007; SAFRAN & MCKEG, 2002).
O tênis não é um esporte de contato, de invasão, em que os atletas disputam o mesmo espaço. Mas é um esporte que exige e compromete o aparelho locomotor, principalmente no aspecto osteoligamentar. Mudanças de direção, de velocidade e descarga de peso excessiva nas articulações comprometem as estruturas anatômicas. As demandas físicas dos treinos e competições geram micro traumatismos repetitivos (FU & STONE; 2001; SILVA et. al., 2005).
O estudo realizado pela Associação Americana de Tênis (USTA) revela alguns dados interessantes a respeito de lesões no tênis:
1) jogadores juniores apresentam maior índice de lesão na coluna (24%) e ombro (21%).
2) jogadores profissionais têm, na articulação do cotovelo, a principal queixa de dor e lesão (GARRETT et. al., 2003).
3) em jogadores mais velhos, entre 41e 60 anos a articulação do cotovelo aparece também como a região mais comprometida. O joelho e o ombro aparecem em segundo lugar. A má utilização da técnica, o estresse e o envelhecimento são fatores que comprometem o surgimento destas lesões (SILVA et. al., 2005).
Outros estudos mostram que jovens tenistas se lesionam com maior frequência. O excesso de competição, o baixo condicionamento físico e a falta da correta orientação são as principais causas de lesões no tênis nesse grupo (GUEDES et. al., 2010).
As lesões no tênis mais comuns são:
Entorse do tornozelo
Epicondilite lateral (Tênis Elbow)
Lombalgia
Lesão do manguito rotator (déficit do movimento de rotação interna)
Osteoartrite do quadril (doença degenerativa)
Tendinopatia patelar (dor Patelofemural)
Fratura por estresse (osso navicular do pé e das vértebras)
Estas lesões no tênis apresentam um quadro preocupante quanto à conservação da saúde do tenista profissional diante das exigências atuais. A análise e o entendimento crítico destes números e observações permitem orientar o treinamento de forma coerente. A utilização de uma preparação física pertinente e eficaz deve atender às demandas específicas destes grupos de atletas. Amadores ou profissionais devem participar de treinos compatíveis com sua capacidade física. A identificação de incidência de lesões específicas no tênis favorece a introdução de exercícios profiláticas e funcionais. Duração, intensidade, volume, densidade e frequência são variáveis fundamentais na elaboração de um programa de treinamento. Aliado à coerência entre demandas físicas, técnicas e táticas dos tenistas, está a didática de ensino. A ordem adequada das cargas, a atenção ao trabalho técnico e a correção correta dos movimentos fortalecem a segurança da saúde deles (PLATONOV, 2004).
As preocupações específicas com a idade, sexo e nível técnico delineiam a metodologia de ensino na Educação Física. Outro ponto importante a ser levado em consideração é o controle de fadiga dos atletas pelo treinador. Isto permite elaborar e ajustar a carga de treino pela resposta subjetiva do atleta. Alimentação e recuperação dos treinos também são fatores indispensáveis que levam a resultados positivos.
Desafio para as novas exigências físicas da atualidade no esporte
O controle eficaz das lesões esportivas se constitui no principal desafio para as novas exigências físicas da atualidade no esporte. O grande desafio da metodologia de ensino da Educação Física nestes próximos anos é conciliar intensidade dos treinos com a saúde. Conciliar também, qualidade de ensino e respeito às potencialidades de cada atleta será um grande desafio.
Assim está o desporto de forma geral. Mais competição, mais intensidade, maior cobrança psicológica. O bombardeio é direto ao atleta, vem de todos os lados. Avanço tecnológico e grandes equipamentos ainda não são suficientes para frear o alto índice de lesões que acometem os atletas de forma geral. Jogar com saúde, treinar em níveis cada vez mais altos, exige uma preparação desportiva eficiente. Não é fácil e nem será!
Com a especialização cada vez mais precoce é necessário sintonizar e ajustar as cargas de treino sem ultrapassar limites. Além de não queimar etapas, o objetivo é potencializar ao máximo o talento de cada atleta. As lesões sempre ocorrerão por acidente de trabalho, como quedas e choques. Mas deverão ser sempre combatidas por um programa de excelência de desenvolvimento e preparação desportiva. Apenas o ensino de qualidade conduzirá os índices de lesões para patamares cada vez menores.
Saúde a todos os atletas e praticantes do esporte!
Referências Bibliográficas
CHIAPPA, G. R. et. al. Fisioterapia das lesões no voleibol. Abordagem das principais lesões, seus tipos, fatores mecânicos., São Paulo: Dobe Editorial, 2001.
FU, F. H. &M STONE, D. A. (Eds). Suport injuries: mechanisms, prevention and treatment. 2. Ed. Philadelphia: Lippincot Williams and Wilkins, 2001.
GARRETT, J.M.; KIRKENDAL, D.T.; JUZMIAK, J. T. A ciência do exercício e dos Esportes. Porto Alegre: Artmed, 2003.
GUEDES, J. M.; BARBIERE, D. F.; FIABANE, F. Lesões em tenistas competitivos. Revista Brasileira Ciência Esporte, Campinas, v. 31, n. 3; p. 217-219, maio, 2010.
LINHARES, L. M. O treinamento como causa de depressão do ombro do membro superior dominante de jogadores de Tênis de campo. Revista Terapia Manual, São Paulo, v.5, n. 20, p. 122-125, 2007.
MORAES, J. C. & BASSEDONE, D. R. Estudo das lesões em atletas de voleibol participantes da SUPER LIGA NACIONAL. EFDeportes: Revista Digital, v. 12, n. 111, 2007.
PALERMO, J. L. Epicondilite lateral em jogadores de tênis. Reabilitar, São Paulo, v. 20, n.5, p. 56-58, 2003.
PLATONOV, V. N. Teoria Geral do Treinamento Desportivo Olímpico. Porto Alegre: Artmed, 2014
SAFRAN, M. R. & MCKEG, D. B. Manual de Medicina Esportiva. São Paulo: Manole, 2002.
SILVA, R. T. et. al. Avaliação das lesões ortopédicas em tenistas amadores competitivos. Revista Brasileira de Ortopedia, São Paulo, v. 40, n. 5, p 270-279, 2005.
Escrito por Ciro Guerra
Formado em Educação Física, Ciro Guerra é sócio-proprietário de uma das mais bem conceituadas academias de pilates e treinos funcionais de Belo Horizonte, a Ciro Guerra Fitness.